Psicanálise e Conversa Fiada
Por Ale Esclapes¹
Bion se pergunta no capítulo 4 de Elementos de Psicanálise o que diferencia uma sessão de psicanálise de uma conversa de bar (não exatamente com essas palavras, mas o espírito é exatamente esse). Essa é uma pergunta maravilhosa, pois questiona o que parece ser algo muito bem estabelecido pelo senso comum – só que não!
E aqui temos uma série de fantasias e fanatismos sobre o tema. Vou falar do que EU penso sobre essa diferença, pois tem muita gente pagando para ter uma conversa fiada ao invés de uma sessão de análise.
Primeira grande fantasia é que em psicanálise se trata de lembrar do passado. Bion nos chama atenção que psicanálise se trata de criar inconsciente, e em certo sentido esquecer para se viver no aqui e agora.
Nesse sentido a sua infância, como você foi amamentado, são tão interessantes para um processo analítico quanto o jogo de futebol que se assistiu ontem. O que importa é o que é vivido no consultório, no aqui e agora entre duas pessoas que estão ali isoladas do mundo. E isso é doloroso – e falar do passado ou de pessoas e experiências que não estão ali servem de fuga para a experiência do instante. Psicanálise se trata de estar vivo ali naquele instante!
Se você está em uma conversa que se discute o pai, a mãe, o chefe, ou o que quer que seja que não esteja ali naquele agora, é conversa fiada. Uma conversa que fale de pessoas e não de relações é uma conversa fiada.
Pior se discute o que como você deve se relacionar com essas pessoas ou situações. O psicanalista, o verdadeiro, não tem acesso a essas pessoas, mas a você e ao que se passa no consultório.
Estar vivo e presente, seguir estando, parecem simples, mas é muito doloroso não ter o passado para nos servir de ponto de apoio e nem o futuro para nos direcionar. Mas é no presente que se cria, se fertiliza e se vive. É isso que a psicanálise pode lhe proporcionar, para o bem e para o mal.
¹Psicanalista, professor, escritor e diretor da Escola Paulista de Psicanálise-EPP e do Instituto Ékatus de Psicanálise. Autor do Livro "A pobreza do Analista e outros trabalhos 1997-2015" e organizador da Coleção Transformações & Invariâncias.
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